quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Os gémeos

Eram gémeos sim. Mas ninguém diria. Um era branco e o outro chocolate. Os pais, esses, eram brancos ambos.
Quando nasceram a família não queria acreditar e por mais que o médico explicasse que tal podia acontecer se, lá para trás, houvesse um parente de côr, o certo é que a dúvida se intalou entre Margarida e Duarte. Dúvida de que não falavam, pensando qualquer deles que se abordassem o assunto, isso iria pôr a nú uma desconfiança que só podia ser insana. Cada um pensava consigo próprio como iriam lidar com o assunto.
Margarida gostava de mandar fazer um exame de DNA mas não tinha coragem de o propôr. Duarte pensava o mesmo mas receava a reacção da mulher. Ambos serenaram um pouco quando a avó paterna disse ter descoberto que um trisavô, que nascera em África, era mulato e a mãe dele, ao que constava, seria negra.
Com o rolar do tempo foram esquecendo esta história. Até chegar o momento de ser necessário fazer um exame para saber qual deles poderia doar um rim ao pai, no caso de ser preciso fazer um transplante.
Colhidos os resultados, a surpresa foi total. Um deles era compatível e eram realmente gémeos. Mas o pai não era o paciente. Tragédia familiar a juntar à preocupação com a doença paterna.
Toda a anterior angústia e desconfiança veio, de súbito, ao de cima. Então se era assim, quem era o pai deles e que comportamento tinha tido Margarida? Ninguém queria, de facto, saber a verdade. Apenas queriam acusar a mãe de mau comportamento e bani-la da família. Ao contrário, os gémeos e, de certo modo, também Duarte, acreditavam na seriedade da mãe.
O transplante foi necessário e realizou-se. Mas Jaime, o dador côr de chocolate exigiu que fossem feitas provas à mãe. Surpresa maior: Margarida não era a mãe biológica dos dois rapazes. A família ia-se desfazendo. Aguentou-os o amor que tinham pelos que consideravam filhos e também a força que unia aquele quarteto.
Quando se encontrou bom, Duarte pôs o caso nas mãos de um avogado que, depois de um ano de investigações, chegou à conclusão de que houvera uma troca. Pôs-se, então, o problema de saber se valia apena tentar encontrar os pais biológicos. E os filhos biológicos.
Perante a questão, foram os gémeos a decidir: "Os nossos Pais são vocês, que nos criaram e deram amor. Para nós isso é suficiente. Quanto ao resto, só vocês podem decidir se querem ou não continuar a investigação"!

Helena

1 comentário:

  1. Por muito que tentemos deve ser difícil imaginar a vida daquela família ano após ano, sem saber ao certo o que teria acontecido.
    São situações muito difíceis de ultrapassar e ainda bem que se esclareceram da melhor maneira.
    Já agora: A minha saudosa mãe, apesar de as circunstâncias não terem sido, a princípio, muito favoráveis, decidiu há 60 anos que o parto se desenrolaria em casa. E se lhe trocassem o tesouro? Aí está um risco que ela não quis correr.
    Ainda hoje eu agradeço a Deus os pais que me couberam na distribuição.
    Um beijo

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