terça-feira, 13 de novembro de 2012

Fado

A Rosa era fadista e como está na sina da canção, a sua vida não foi feliz.
"Filha de pai desconhecido", era o que o seu registo contava. Mas a mãe, antes de morrer, disse-lhe quem era o progenitor que, à época do nascimento, estava casado. Por isso Adozinda jamais lhe dera conhecimento da bastarda. Nem teria podido, já que o putativo responsável da gravidez, mal soubera dela, pôs-se ao fresco.
Os anos correram. Rosa tomou nome e apelido. E também profissão. Passou a ser Rosa Costa, fadista consagrada daqueles que amavam a canção nacional e as touradas. Com isso veio o amor eventual, o amor passageiro. Aquele que se toma por uma noite, ou por uma semana, e que é passe ou salvo conduto de entrada nos luxuosos hotéis onde este tipo de histórias se costuma abrigar.
Um dia, talvez por se ter dedicado mais do que devia, a quem apenas dela apenas se servia, reviu-se na aventura materna, como se esta fosse herança a que tivesse de prestar tributo. Sorte a sua, não ter tido fruto desse seu caso. Que haveria de frutificar de outro modo, confrontando-a consigo própria e com um destino que ela decidiu havia de ser diferente.
Pegou nos poucos papeis que a mãe lhe deixara e partiu a procurar as suas origens. Não foi tarefa fácil, porque ninguém lha queria facilitar. Todavia, com o pouco que sabia, meteu-se a caminho do Brasil, ao inesperado confronto com seu pai. 
Encontrou-o, moribundo num hospital paulista. Mas haviam de abraçar-se trinta e sete anos depois.
Hoje Rosa já não é Costa. Nem fadista. É socialite e chama-se Gaby. Gaby Dirceu, dona da maior rede de drogarias do país irmão. Nem é, mais, a filha de pai desconhecido...

Helena

sábado, 3 de novembro de 2012

Um Domingo em Paris

Era Domingo em Paris. Como sempre acontecia quando Joana viajava em trabalho e tinha reuniões à segunda feira, aproveitava para partir ao sábado e descansar naquela que era, para si, a primeira cidade depois de Lisboa. Ambas tinham uma luz especial e o céu rosado do Outono na capital francesa era algo que Joana não dispensava quando lá ia.
Chegara na véspera, largara a mala no hotel e, como sempre acontecia, saíra de imediato para se perder na multidão que circulava nas ruas num fim de semana de sol.
Jantara num pequeno bistrot perto dos Campos Elísios, fora ao cinema e, ao fim da noite, antes de se recolher, ainda tomara um chocolate quente numa esplanada, onde um jovem tocava violino.
Acordara tarde no dia seguinte, que estava belíssimo. Decidiu caminhar pelas ruas a apanhar o sol no rosto. A certa altura apeteceu-lhe parar num drugstore para comprar umas revistas e se sentar a tomar um café.
Dirigiu-se à grande mesa quadrada onde estavam expostas as publicações mais recentes. De repente sentiu que estava a ser observada, mas o grupo que rodeava a mesa não lhe permitiu ver com discrição quem o fazia. Esperou um pouco e escolheu uma revista de cinema. Quando estendeu a mão para a apanhar, alguém colocou outra mão sobre a sua. Entre o encontro de olhares que se seguiram mediaram segundos, sem que qualquer gesto fosse feito. 
Quando finalmente Joana largou a revista, não sabia bem o que fazer. Só conseguiu sentar-se na mesa do café e ficar parada. Uns minutos depois tinha-a na sua mesa. E com ela, a mão de que antes se libertara, que agora pegava na sua. 
Foi um cálido encontro numa tarde de Domingo em Paris...

HSC